quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

LITERATURA PORTUGUESA

JOSÉ RÉGIO, pseudónimo de José Maria dos Reis Pereira.
Nasceu em Vila do Conde, em 1901 e faleceu em 1969.
Este escritor português viveu uma grande parte da sua vida em Portalegre (de 1928 a 1967).
Foi possivelmente o único escritor em língua portuguesa a dominar todos os géneros literários, tendo, nomeadamente, sido poeta, dramaturgo, romancista, novelista, ensaísta, cronista, jornalista, crítico e historiador de literatura.
Foi também um grande coleccionador de arte sacra e de arte popular.
Como escritor, José Régio é considerado um dos grandes criadores da moderna literatura portuguesa. Reflectiu em toda a sua obra problemas relativos ao conflito entre Deus e o Homem, entre o indivíduo e a sociedade.
As suas casas, onde viveu, quer a de Vila do Conde, quer a de Portalegre, são hoje casas-museu.
De todos os seus poemas, há um de que gosto particularmente, talvez pela revolta, pela força, pela determinação que traduz….

CÂNTICO NEGRO

“Vem por aqui” – dizem-me alguns com olhos doces
Estendendo-me os braços e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui”
E eu olho-os com olhos lassos,
Há nos olhos meus, ironias e cansaços
E cruzo os braços
E nunca vou por ali…

A minha glória é esta
Criar desumanidade
Não acompanhar ninguém
Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre a minha mãe

Não, não vou por aí!
Só vou por onde me levam meus próprios passos…
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Porque me repetis: “vem por aqui”?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos como farrapos,
Arrastar os pés sangretos
A ir por aí…

Se vim ao mundo,
Foi só para desflorar florestas virgens
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias sangue velho dos avós
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o loge e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos…

Ide, tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras e tratados e filósofos e sábios…
Eu tenho a minha loucura….!
Levanto-a como um facho,  arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios…

Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém…
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo…

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Niguém me diga: “vem por aqui”!
A minha vida é um vendaval que se soltou…
É uma onda que se alevantou….
É um átomo a mais que se animou…
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
Sei que não vou por aí.



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4 Comentários:

Às 30 de dezembro de 2010 às 19:12 , Blogger Andradarte disse...

Muito boa escolha cara Maria A....., vou ver se
faço um Post com José Régio...
Que 2011 lhe seja favorável nestas andanças,...
Felizzzz...2011..
Beijo

 
Às 30 de dezembro de 2010 às 20:19 , Blogger Albertina Granja disse...

Obrigada Andrade
Um Feliz 2011 também para si
Até breve.
Albertina Granja

 
Às 31 de dezembro de 2010 às 19:04 , Blogger leandro guedes disse...

OLá Albertina, boa noite.
Parabens por mais este texto e por este belo poema, embora um pouco agitador...
Bom Ano para si e que tudo lhe corra bem.
Beijinhos
leandro guedes.

 
Às 31 de dezembro de 2010 às 19:08 , Blogger Albertina Granja disse...

Obrigada Leandro pelas suas palavras.
Um bom ano também para si.
Até breve.
Albertina Granja

 

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