segunda-feira, 20 de junho de 2011

SOBRE JOÃO DE DEUS



João de Deus nasceu em São Bartolomeu de Messines, no Distrito de Faro, em 8 de Março de 1830 e morreu em Lisboa em 11 de Janeiro de 1896.
Estudou Direito na Universidade de Coimbra entre 1849 e 1859. Neste período conviveu com notáveis homens de letras, entre os quais se destacam Teófilo Braga e Antero de Quental. Aí desenvolve a sua veia poética, dedicada sobretudo à Mulher, a Deus e à Natureza mas que inclui também registos satíricos, típicos da vida académica coimbrã.

Pintor, tocador de viola e cantador de modas populares, amante da vida boémia, vagueou por Coimbra em busca da sua vocação.
Depois de uma actividade profissional sem relevo como advogado e jornalista foi eleito deputado pelo círculo algarvio de Silves em 1869, mantendo uma actividade dispersa e irregular como poeta de vários estilos.
O sucesso da sua Cartilha Maternal foi enorme e em 1888 as Cortes adoptaram-na como método oficial de leitura e João de Deus foi nomeado Comissário Geral do Ensino da Leitura.
Em 1895, é organizada uma grande homenagem ao poeta à qual se associou o Rei D. Carlos, contrariamente à tradição portuguesa que só reconhece os seus grandes depois de mortos. Foi-lhe proposto um título nobiliárquico, que recusou.

A Academia Real das Ciências proclamou-o Sócio de Honra. Em resposta à homenagem de estudantes de todo o país que se dirigiram a sua casa em grande cortejo, João de Deus assoma à varanda e declama de improviso:
Estas honras e este culto
Bem se podiam prestar
A homens de grande vulto.
Mas a mim, poeta inculto,
Espontâneo, popular...
É deveras singular!
João de Deus morreu em 1896, tendo sido sepultado no Mosteiro dos Jerónimos, honra reservada apenas aos mais notáveis portugueses.
Eis um dos seus belos poemos:
Amo-te Muito, Muito!

Amo-te muito, muito!
Reluz-me o paraíso
Num teu olhar fortuito,
Num teu fugaz sorriso!

Quando em silêncio finges
Que um beijo foi furtado
E o rosto desmaiado
De cor-de-rosa tinges,

Dir-se-á que a rosa deve
Assim ficar com pejo
Quando a furtar-lhe um beijo
O zéfiro se atreve!

E às vezes que te assalta
Não sei que idem, jovem,
Que o rosto se te esmalta
De lágrimas que chovem;

Que fogo é que em ti lavra
E as forças te aniquila,
Que choras, mas tranquila,
E nem uma palavra?...

Oh! se essa mudez tua
É como a que eu conservo
Lá quando à noite observo
O que no céu flutua;

Ou quando à luz que adoro
Às horas do infinito,
Nas rochas de granito
Os braços cruzo e choro;

Amamo-nos! Não cabe
Em nossa pobre língua
O que a alma sente, à mingua
De voz... que só Deus sabe!

João de Deus, in 'Campo de Flores'

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